segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Em tempos de vale tudo, resta a Consciência!

Cresci (e muito! São quase 2 metros!) a comer Robalos pescados pelo meu Pai no Rio Douro. Ao fundo, à bóia, com isco, com borrachinha de bicicleta chico fininho, grandes, pequenos... Valia tudo e o peixe não faltava!

Cresci e comigo cresceu também o amor pela pesca e, sobretudo, pela pesca do Robalo - o grande predador dos mares da costa Norte! O método foi mudando e actualmente só pesco aos Robalos com iscos artificiais. A mudança é um processo natural, na busca por algo que nos proporciona mais prazer. Ao fim ao cabo, é isso que todos nós buscamos nos nossos diferentes hobbys: momentos de abstração das rotinas do dia-a-dia... paz...contato com a Natureza... No que à pesca dos robalos diz respeito, o prazer vem cada vez mais destes factores, mas também da procura, cada vez mais difícl, dos Robalos. A crescente dificuldade em dar de caras com estes predadores é facilmente justificável pela sua exponencial escassez, documentada por vários estudos científicos. É fácil apontar o dedo aos outros e mantenho a minha convicção profunda de que na costa onde pesco habitualmente as maiores atrocidades são praticadas pelos pescadores profissionais, seja na forma de artes de pesca ilegais, de desrespeito pelas distâncias mínimas em que colocam as mesmas, da quantidade de pescado ou dos tamanhos mínimos das espécies capturadas... Vale tudo! A verdade é que a legislação em vigor é inadequada e, pior que isso, não se faz cumprir! 
Enfim... Em alguns Países discutem-se atualmente leis mais restritivas de captura do pescado, períodos de defeso, preservação das espécies... Cá teremos de começar por nos preocupar em fazer cumprir a (escassa) legislação que temos e, só depois, reformula-la!

Mas então o pescador lúdico não tem responsabilidade e não pode fazer nada para preservar os recursos actualmente existentes? Claro que pode! Antes de mais nada pode e deve manter limpos os spots por onde passa. Lixo, restos de comida, plásticos e, pior ainda, peixe que foi morto depois de pescado e deixado morto no pesqueiro são das piores visões que tenho tido por essa costa fora! Felizmente raros!

Para não ferir susceptibilidades vou apenas falar da minha experiência e de erros meus que tenho tentado corrigir ao longo dos tempos. 
Começando pelos robalos que comia em farinha de pau quando era miúdo, é com alguma felicidade que vejo actualmente o meu Pai a libertar esses peixes pequenos. 
De igual forma e já há mais tempo, pratico pesca sem morte (usando anzóis sem barbela) em águas interiores independentemente do tamanho das capturas.
Outra vertente muito importante da pesca lúdica, nomeadamente da pesca com amostras, é a vertente económica. É possível pescar com equipamentos mais em conta, mas para quem tem o vício à flor da pele e não passa uma semana sem ir salgar o material (como é o meu caso)  é imprescindível um investimento considerável. E, mesmo para um lúdico e amante da pesca, é difícil não querer ver um retorno do investimento feito em forma de peixe capturado, seja para consumo próprio ou mesmo para vender e sentir alguns dos euros gastos a regressar ao bolso. Os tempos de crise nem tudo justificam! Em tempos, vendi 3 robalos depois de partir uma Lesath ao içar um robalo de 4,700Kg que pesquei à superfície. Cheguei a casa contente pelo robalo, mas triste pela perda da cana quase nova em folha e ainda tive de ouvir a minha mulher dizer: "Como vou cozinhar esse robalo tão grande que nem cabe no forno? Vê mas é se o vendes para abater ao preço dessa cana tão cara"! Acabei por vender esse peixe e mais 2 e a sensação foi péssima! Pior fiquei quando o meu Amigo Toninho que me tinha vendido a cana me conseguiu trocar a cana partida por uma nova! Nunca quis nem quero tirar qualquer dividendo da pesca, a não ser o prazer que me dá e que na altura, com a venda dos 3 peixes se perdeu. Coincidência ou não, depois de vender os 3 robalos, passei o maior período da minha vida sem pescar um! Foram quase 6 meses sem ver escama! Prometi que nunca mais, até hoje. Não é nada de que me orgulhe, bem pelo contrário, mas faz parte do meu passado como pescador e aprendi com ele.

Ao fim de muitos anos, na última viagem de pesca que fiz, conheci um senhor chamado Philip Rogers - um grande Pescador Lúdico e uma excelente pessoa com quem talvez tenha passado quase tempo a conversar como a pescar (e chegamos a fazer sessões de 7 horas de spinning da costa!). A determinada altura, depois de mostrar com orgulho algumas fotografias de robalos por mim capturados e de me gabar por libertar os peixes sem medida, fui confrontado com uma pergunta que me deixou muito tempo a pensar nela: "Por que não libertas os grandes também? Esses é que se reproduzem e dão origem a centenas mais todos os anos! De que gostas mais: de os pescar ou de os comer"? A resposta foi imediata: "de os pescar"; mas fiquei a pensar naquilo... E de facto é verdade, eu gosto mesmo é de dar com eles, de os pescar e de guarda-los numa fotografia para sempre! Detesto quando dou com eles e me ganham! Ahahahahahah! Detesto perder peixe! Mas ganhar a batalha, fotografar o troféu e devolvê-lo ao seu meio não reduz em nada o meu prazer, pelo contrário!

O "catch and release", "catch, photograph and release", em Português de Portugal captura, fotografia e libertação não são nada inovadores entre nós. Quando comecei a praticar spinning já muita gente defendia a sua prática, embora mais teóricos do que praticantes ("olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço") mas essa é outra história que não interessa aprofundar... Nunca gostei, nem gosto de fundamentalismos e, por isso, de agora em diante vou fazer os possíveis para libertar todos os robalos que pesque, grandes e pequenos, nas melhores condições possíveis. É o que passarei a fazer de consciência. Sem a pressão de ninguém e sem querer pressionar nem impor nada a ninguém. Passará a ser algo que fará parte e exponenciará o amor que sinto pela pesca e, em particular, pela pesca do Robalo, na esperança que um dia as minhas filhas possam vir a ter o mesmo amor e a oportunidade de ainda haver robalos sem ser de aquacultura! 
Se a minha mudança de comportamento tem dimensão suficiente para ter repercussões positivas no futuro? Quero acreditar que sim! Quanto mais não seja fico de bem com a minha consciência por fazer a minha parte. 
Em tempos de vale tudo, resta a consciência!


Um abraço a todos e boas pescas!